NX-350 Sahara: Saudade não tem idade

Um modelo da Honda fora de linha, mas ainda querido por muitos motociclistas. Veja a avaliação.

Por Leandro Alvares

Mário Sérgio Figueredo

Li um teste publicado em 1993, que compara a Honda NX-350-Sahara a uma moto 3 em 1, ou seja, uma estradeira para viajar nos fins de semana, uma fora-de-estrada para relaxar nas estradinhas de terra ao redor do sítio e uma urbana para ir e voltar do trabalho todos os dias.
 
Depois de ser o feliz proprietário de oito delas, por algo próximo há dez anos — desde a primeira, lançada em 1990 até a 1997, penúltima a ser produzida —, tenho que atestar a veracidade da feliz afirmação daquele jornalista, que com sua sensibilidade afinada conseguiu expressar resumidamente toda a essência dessa moto fantástica que é a Honda NX-350 Sahara.
 
Até então eu me contentava com o que a XLX-350 oferecia, e não eram poucas as suas qualidades, mas nunca me dei bem com a sua partida "a feijão", chegando até a me machucar algumas vezes com os "contras" que aquele pedal maldito dava.

E a danada nunca pegava na primeira pedalada. Era uma moto temperamental e só pegava quando queria e muitas vezes, apesar de insistentes pedaladas, recusava-se terminantemente a funcionar seu motor. Até acho que às vezes ela ficava rindo do meu esforço sem resultados.
 
Com a Sahara, veio aquele querido, maravilhoso e fantástico botãozinho amarelo no punho direito. Bastava um leve toque e o motor roncava bonito, sempre na primeira tentativa, mesmo nos dias mais gelados pelas geadas do inverno curitibano, quando se fazia necessário o auxílio do botão do afogador que ficava confortavelmente localizado ao lado do painel de instrumentos. Disse adeus às pedaladas (deixa elas pro Robinho) e jurei nunca mais comprar nenhuma outra moto desprovida da abençoada partida elétrica.
 
Andar com a Sahara foi outra agradável experiência. Muito parecida com a XLX-350, em termos de conforto, ao encarar as imperfeições tanto de pistas asfaltadas como em estradas de terra, mesmo as mais esburacadas, ela oferecia ainda proteção aerodinâmica para pernas, mãos e principalmente o peito do piloto, eliminando o desconforto do vento batendo nestas partes em velocidades superiores a 120 km/h. Isso graças à sua couraça de fibra-de-vidro e à bolha de acrílico que também a embelezavam, atribuindo-lhe um porte de moto grande, de maior cilindrada.
 
Outra modificação implementada pela Honda que aprovei de imediato foi o rebaixamento do pára-lama, que foi fixado sobre a roda, eliminando as incômodas balançadas provocadas pelo vento em velocidades mais elevadas. Isso foi possível porque alguém lá na Honda percebeu o óbvio: nenhum consumidor da Sahara iria usá-la em condições extremas que exigissem o pára-lama fixado abaixo do farol. Ponto para a Honda.
 
Junto com esse embelezamento da moto, vieram alguns itens de conforto prontamente aprovados por seus novos adeptos, como os estribos e pedal de câmbio emborrachados, que preservava os calçados, bagageiro original de fábrica, painel mais moderno incorporando numa única peça o velocímetro, conta-giros e as luzes de ponto-morto, indicativas de direção e de luz alta, fugindo do tradicional padrão de dois instrumentos individuais, característico nas motos até então.
 
Uma das suas qualidades que muito me agradaram foi a sua falta de apetite, ou seja, fazer médias de consumo em torno de 19 km/l na cidade e 24 km/l na estrada era muito mais do que eu esperava para uma moto que oferecia tanto em matéria de força e velocidade. As paradas no posto de gasolina não eram tão dolorosas quanto poderiam ou deveriam ser.
 
Surpresa boa mesmo foi na estrada. Manter velocidades de cruzeiro em torno de 120 a 130 km/h, apesar de acima dos limites permitidos nas estradas paranaenses, aconteciam sem o menor esforço ou sacrifício da máquina, graças ao seu bem escalonado câmbio de seis marchas.

Girando um pouco mais o acelerador era fácil chegar aos 145, 150 km/h, já adentrando a faixa vermelha do conta-giros, desempenho que refletia segurança em ultrapassagens mais ousadas. Mesmo assim, senti falta de pelo menos mais uns 15 km/h de velocidade final. Mas isso era querer demais para uma trail com pouco menos de 340cc.
 
Apesar da sua altura mais elevada do solo e também da sua estrutura e seus pneus on/off road, a Sahara transmitia muita segurança nas curvas e as encarava de frente, oferecendo estabilidade em inclinações acima do que o bom senso recomendava.

Mesmo em asfalto ou paralelepípedo molhados, dava para abusar um pouquinho da sua estabilidade oferecida pelos pneus tipo biscoito que a equipavam originalmente de fábrica. Pra ela, não importava se a estrada era boa ou ruim, encarava do mesmo jeito e passava por quebra-molas como se eles não existissem, sem necessidade de redução da velocidade, bastando dar uma pequena levantada da região glútea do banco.
 
Item que deixava um pouco a desejar era a estrutura e o formato do banco, que provocava dores depois de tocadas mais demoradas, principalmente na estrada, exigindo paradas freqüentes para esticar as pernas e passar o desconforto nos quadris.

Pior ainda era andar com garupa, pois o formato do banco liso e inclinado para frente fazia com que o garupa escorregasse contra o piloto, pressionando partes sensíveis contra o tanque de gasolina. Isso exigia reposicionamento constante tanto do garupa como do piloto durante a tocada.

Nas frenagens não tinha escapatória, o piloto tinha que suportar o seu peso e o do garupa nos braços e isso cansava demasiadamente. A vibração do seu motor monocilíndrico também era incômoda, mas perfeitamente suportável.
 
Nunca fui muito ligado a detalhes técnicos das motos, mas na Sahara sempre tive a impressão de que os engenheiros da Honda não economizaram nos seus componentes. Todo o material utilizado na sua fabricação era de excelente qualidade e durabilidade, desde o cabo de embreagem, jogo de ferramentas, sistema de transmissão (corrente, coroa e pinhão), borrachas, plásticos, tudo era de qualidade superior e hiper-dimensionado.

Itens que merecem destaque são a embreagem, que agüentava soberbamente mesmo quando exigida ao limite, e o sistema de freios a disco simples na dianteira e tambor na traseira, que não decepcionava, dando extrema confiança ao piloto quando exigidos com firmeza.
 
Viajar à noite era outro momento em que se podia perceber o zelo de quem projetou seu sistema elétrico. O farol quadrado, fixo na carenagem com uma única lâmpada, clareava muitos metros à frente, mesmo em luz baixa, mostrando claramente qualquer obstáculo a uma distância segura, dando tempo para reações emergenciais.

O restante do conjunto óptico, como piscas e lanternas, cumpriam corajosamente sua função e durava muito tempo — em dez anos, lembro de ter trocado apenas uma lâmpada do farol, duas de pisca e outra da lanterna traseira, cujo filamento da luz de freio havia se rompido.
 
Defeitos, claro que ela tinha, não poderia ser perfeita. Além do banco desconfortável e a vibração do motor monocilíndrico que já citei acima, apresentava um vazamento crônico de óleo pelo respiro, que aparecia sempre que era ligada com motor frio e inclinada sobre o descanso lateral, detalhe que aborrecia por sujar o chão da garagem, mas não representava nenhum problema mecânico. Simples erro de projeto que não trazia maiores conseqüências.
 
Quanto à manutenção, pelo fato de que com nenhuma delas ultrapassei 30 mil km rodados, somente fiz troca de pneus, óleo, pastilhas e lonas de freio, sempre com preços aceitáveis, desde que se optasse em fugir das concessionárias Honda.

Um jogo de pastilhas de freio originais que custava perto de R$ 130 na concessionária, mas era facilmente encontrada no mercado paralelo, de marca consagrada e ótima qualidade e durabilidade,  por módicos R$ 17.

Mesmo nas que usei até perto dos 30 mil km o sistema de transmissão ainda encontrava-se em boas condições graças aos cuidados que sempre tive com a lubrificação da corrente.
 
De todas as inúmeras motos que tive, seguramente a Sahara foi a que melhor me adaptei e tornei-me fã incondicional. Lamentavelmente sua produção foi interrompida em 1998 com a substituição pela Falcon, que ficou "devendo" alguns itens como a sexta marcha, proteção aerodinâmica e economia de combustível, mas sendo aprimorada no grande ponto fraco da Sahara, que era o banco extremamente desconfortável.
 
O mercado de motos está em permanente desenvolvimento e parece que algumas montadoras estão acordando para este fato. Espero ansiosamente que logo tenhamos à disposição para compra motos dual purpose mais sofisticadas, como a TransAlp, Varadero, BMW e V-Strom, todas de menor cilindrada e conseqüentemente com preços mais acessíveis e adequados ao fraco poder aquisitivo dos brasileiros, suprindo assim a lacuna deixada pela Honda NX-350-Sahara.

O “motonauta” Mário Sérgio Figueredo participou do Moto Repórter, canal de jornalismo participativo do MOTO.com.br. Para mandar sua notícia, clique aqui.


Fonte:
Moto Repórter

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