Viajando e transpondo fronteiras

Uma aventura que ultrapassa limites geográficos e acaba no Brasil.

Por André Jordão

José de Jesus Teiga Júnior

A aventura começou dia três de janeiro de 2009, com a volta marcada para dia 12 do mesmo mês. Dez dias de viagem e mais de 6400 km para percorrer, atravessando a cordilheira dos Andes, passando por paso águas negras na Argentina indo parar no Chile e com retorno para a Argentina pelo paso de Jama.

Três de janeiro de 2009. Porto Alegre/RS - Taquarembó URG - 610 km. Com uma chuva intensa partimos pela manhã e rodamos 300 km. Depois disso o tempo melhorou e passamos o restante da viagem sem problemas, nem na fronteira uruguaia, onde não estão mais cobrando a Carta Verde.

Chegamos ao final da tarde em Tacuarembó (terra do saudoso Carlos Gardel), juntamente com um grupo de amigos de Porto Alegre que havia ido para o início do Dakar em Buenos Aires. Foi o momento também que troquei de moto, minha Kawasaki 14 Concours por uma KTM 990 para fazer mais preparado o que mais gosto, o Rípio da Cordilheira dos Andes.

Quatro de Janeiro. Tacuarembó – Córdoba - 910 km. Conforme o planejado fizemos todo o percurso. Foram 910 km em 11 horas. O dia começou com uma temperatura muito agradável e até a fronteira tudo foi muito bem. Chegando à fronteira de Paissandú-Colón, ficamos uma hora parados, pois tinham muitos carros para passar, já que a fronteira de Fray bentos ainda estava bloqueada por causa da crise Argentina-Uruguai disputando a fábrica de celulose.

Quando fomos passar, tivemos um problema com a Carta Verde que foi feita e paga via internet e não tinha o carimbo. Não foi fácil, mas com paciência conseguimos prosseguir. À tarde o sol apertou e não tinha vento. É uma região agrícola, farta principalmente, pelo cultivo de girassóis.

Cinco de Janeiro. Córdoba - San Juan - 610 km. Saímos de Córdoba tarde, pois fomos trocar o pneu traseiro e as pastilhas de freio da moto do Jimi, depois disso, fomos para a estrada. Primeiramente iríamos pegar a Rota 20 que vai ao sul de Córdoba, mas optamos por fazer a Rota 38 ao norte.

Com os primeiros 100 km terríveis, por se tratar de uma região populosa, tivemos que ficar no trânsito lento. A partir daí fomos subindo um platô e passando para o típico deserto argentino. Pessoal, 40º na telha! E como eu e o Jimi já temos pouco cabelo, ficou terrivelmente quente, mas compensamos com muita água e filmagens na Câmera acoplada na moto do Jimi.

Foi o aperitivo para o que viria no outro dia. A subida na madruga para o Paso Águas Negras era nosso principal objetivo. Ah, outra cena maravilhosa vista nesse trajeto, foi dos Cavalos Selvagens correndo por essa região. Incrível mesmo. Chegando ao final da tarde, ficamos em um hotel na entrada da cidade de fácil acesso para pegarmos a estrada no outro dia. À noite fomos jantar num restaurante tradicional da cidade onde o garçom mais novo tinha “350” anos de idade.

Seis de Janeiro. O PRICIPAL DIA. San Juan a La Serena - via ÁGUAS NEGRAS - 570 km. Bem pessoal, sou uma pessoa que tem já alguma experiência em Cordilheira dos Andes, entretanto os momentos mais maravilhosos passados por mim foram nesse dia. Estrada linda e perigosa que a cada quilômetro mostrava as suas diversidades.

Os 570 km desse dia foram percorridos em 10h30min, sendo que de Rípio(estrada de chão)  foram 155 km  gastos em 6hs. Não só pela dificuldade da pista, mas também por pararmos para muitas fotos e filmagens.

Foram 180 km de San Juan até a fronteira da cidade de Las Flores, onde tem que entrar na cidade para a última recarga, após isso só há abastecimento em Vicuña (260 km depois) já no território chileno. Iniciamos o dia com 15 graus, mas no Paso mesmo a temperatura chegou à zero, embora aja predominância do clima desértico, os montes estão próximos e têm muito gelo, criando um clima mais úmido.

O Rípio variando, de compactado para alguns bolsões de pedras mais espalhadas, me lembrou muito a subida da cordilheira peruana que fizemos em 2006 pela estrada do pacífico, que estão construindo entre o Brasil e o Peru. Tem que ter muito cuidado, pois há pontos perigosos, com pedras soltas, pista pequena e com inclinação para fora e sem proteção.

Aos que querem passar por lá, sempre recomendo que nessas travessias tenham muito mais atenção. São vários trechos onde o gelo e a neve atravessam a pista por mais de sete metros de altura. Há também dois lagos, um na entrada e outra na saída da travessia. 4780 metros. Paso Águas Negras. Foi o ponto mais alto e frio do passeio, zero grau e com o efeito da altitude nos enganando. Tontura, Dor de ouvido, cansaço ao mínimo esforço. Faz parte de toda essa maravilha que o motociclismo nos proporciona. 

Sete de Janeiro. La Serena - 10 km e muitas caminhadas. O quinto dia foi para descansar e, além disso, para poder atualizar as informações de imagens, filmagens, e-mails e também para aproveitar e ver por onde faríamos a nossa volta. Definido. Faríamos La Serena, Antofagasta, San Pedro de Atacama (via paso de Jama), Salta, Corrrientes, Uruguaiana e por final Porto Alegre.

Descansando e aproveitando a maravilhosa gastronomia local com os seus exclusivos locos, assados de tiras, empanadas, palta reina e sushi. Faltou dia para toda essa comilança.  Maravilha, prontos para a próxima etapa, à volta onde tínhamos um longo passo a dar, Antofagasta.
Oito de Janeiro. La Serena - Antofagasta - 915 km. Saímos cedo para fazer nossa nova etapa, Antofagasta, sabendo que o dia seria longo e o percurso também. De primeira aconteceu algo que não esperávamos passar nesse percurso, o frio, oito graus pela manhã e com o andar das motos, tivemos que colocar toda a roupa de frio, que nos durou os 600 km restantes.

Foram retas longínquas acompanhadas pelo litoral e pela cordilheira, com parada obrigatória na escultura, La Mano Del Desierto, que fica uns 80 km antes de chegar a Antofagasta vindo pelo sul.

Nove de Janeiro. Antofagasta - San Pedro de Atacama - 320 km. Saída do hotel cedinho para poder chegar cedo, pois haviam nos falado que a cidade poderia estar cheia e achar alojamento ou bons hotéis poderia ser um problema. Nesse trajeto fica a região das maiores minas de cobre do mundo. Bem pessoal, o clima da região tem mudado nesses últimos anos, e frentes de ar vindo do oceano jamais tinham atingido essa região, o que tem acontecido ultimamente.

Chegamos no início da tarde em San Pedro de Atacama, com sua população alternativa dando as boas vindas. Além de a cidade estar com um bom movimento, o que me surpreendeu foi o número de motociclistas que estavam por lá. Só no nosso hotel tinha umas 40 motos. Italianos, peruanos, costa riquenhos, alemães e nós, brasileiros.

Ficamos para algumas compras e jantamos cedo, pois no outro dia tinha o Paso de Jama, e o grupo de italianos, que eram em 28, iam para o mesmo destino que nós, a cidade de Salta. Tínhamos que passar a fronteira antes deles, pois demoraria muito para passar, já que o pessoal em Jama é meio demorado para liberar.

Dez de Janeiro. San Pedro de Atacama a Salta - 595 km. Acordamos cedinho para passar a fronteira antes dos Italianos, para não pegar o Paso de Jama caótico. Na saída tivemos uma boa surpresa, conhecemos o Ricardo e seu filho em sua GS, eles tinham feito o percurso com a turma do Alex para a saída do DAKAR, em Buenos Aires.
Fizemos a Fronteira Chilena em San Pedro de Atacama.

Temos sempre que estar atentos na hora de fazer as fronteiras, mesmo na entrada do Brasil, pois sei de casos em que por ficar um tempo maior fora as motos não puderam entrar no país mesmo tendo os documentos (só no Brasil para isso acontecer mesmo).

Saímos com 15 graus e logo nos primeiros 50 km de subida a temperatura caiu para três graus, mais tarde, zero grau e com o vento a sensação térmica certamente passava dos menos cinco graus. Recadinho aos que passam pelo paso de Jama: Aos que pensam que o posto de gasolina está aberto na fronteira, esqueçam, só para março me disseram, mas ficará bom para acelerar sem precisar se preocupar com a autonomia. Próximo abastecimento, só em Susques.

A parada no Salar grande é obrigatória por sua beleza, dando um aperitivo para os que querem um dia fazer o Salar de Uyuni na Bolívia e também para dar uma descansada no corpo, pois o que viria a seguir eram os famosos caracóis de Jujuy.

Recomendo todos a irem pela Rota 9, que liga Jujuy a Salta, com mais de 260 curvas em 50 km. É bem perigosa, passa um carro só em alguns trechos, mas com atenção e responsabilidade, tenho certeza que nunca a esquecerão. A chegada em Salta foi tranquila e nesse dia decidimos que iríamos antecipar a viagem em um dia, o que seria mais um desafio para nós, fazer o Chaco e ter que ir dormir em Uruguaiana, já no Brasil.

Onze de Janeiro. Salta a Uruguaiana - 1210 km. Foi o dia em que mais rodamos. Saímos cedo, pois sabíamos que se o tempo fosse favorável a nós, poderíamos alcançar nossa meta. Ao sair, lua cheia se pondo, no final do dia, ela estaria nascendo para mim e o sol que ao sair estava nascendo, no final do dia se pôs para mim. O objetivo de sair cedo também foi para não pegar o deserto do Chaco muito tarde, pois sabíamos que o sol por lá não é fácil.

Os quase 600 km que atravessamos foram muito bons, pois já peguei o Chaco com rípio, com vento, areia e calor, e dessa vez foi muito melhor. O tempo limpo, sem vento, mas com o calor pegando nos 300km finais. Chaco é o Chaco, dessa vez foram 42 graus. Os animais que sempre são uma dificuldade nesse trajeto, foram amistosos conosco dessa vez, apenas duas vezes quase fomos atropelados por porcos e outras por cavalos, cabras e aves.

Na chegada do final do Chaco em Corrientes, nossos parceiros desde San Pedro de Atacama se despediram, pois iriam pegar outro caminho para irem para casa, foi uma ótima parceria e esperamos que possamos nos cruzar por essas estradas da vida. Coisas que o motociclismo proporciona, grandes laços de amizade e novos amigos. Ainda tínhamos mais 350 km a percorrer. Tudo tranquilo, chegamos a Uruguaiana no início da noite. 

Doze de Janeiro. Uruguaiana Porto Alegre - 635 km. Como o Jimi ainda iria para Caxias do Sul saímos cedinho, pois também dormimos cedo já que o dia havia sido longo. Passando pela nossa estrada e olhando o nosso maravilhoso pampa gaúcho reparei que também temos muito para mostrar. A estrada estava ótima, o tempo agradável e deu para curtir bem nossas paisagens. Realmente nossa terra é bonita e como é bom estar em casa.

Espero que todos tenham apreciado minha nova aventura sobre duas rodas, por essas estradas da vida. Fiquem com Deus e muita paz para nós.

O “motonauta” José de Jesus Teiga Júnior participou do Moto Repórter, canal de jornalismo participativo do MOTO.com.br. Para mandar sua notícia, clique aqui.


Fonte:
Equipe MOTO.com.br

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