Uma aventura entre amigos de 1.579 Km
O internauta Antonio Carlos Ferreira conta sobre sua viagem até a Serra do Rio do Rastro, SC.
Por Roberto Brandão
Por Roberto Brandão
Antonio Carlos Ferreira
Na noite de sexta-feira, dia 6 de setembro de 2009, nossa turma conversava descontraidamente sobre passeios e viagens de motos, no local combinado de sempre, bebendo uma “coquinha”, beliscando uma porção de “iscas de tilápia à milanesa” quando veio a pergunta; para onde vamos nesse feriado de 7 de setembro? Serão 3 dias livres e seguidos.
Houve várias sugestões, alguns colegas chegaram a mencionar que a previsão do tempo não seria favorável para sair de moto. Nosso amigo Gerson (PHD Negão) sugeriu um passeio até a Serra do Rio do Rastro/SC. Um “tiro” de mais ou menos 1600 Km. Fui o primeiro a concordar com esse passeio, desde que o tempo não nos atrapalhasse. Alguns colegas ficaram de dar a resposta depois. Na finalização desse papo, combinamos de verificar na internet as previsões do tempo para os próximos três dias, sábado, domingo e segunda-feira, e só depois daríamos o OK por telefone.
Cheguei em casa, pesquisei na internet e as previsões eram; sábado nublado o dia todo no Paraná, domingo tempo bom em Santa Catarina e segunda-feira, dia nublado em SC pela manhã e chuvas esparsas no Paraná à tarde, dia do nosso retorno. Apenas eu com minha esposa e meu amigo Gerson, também com sua esposa Vera, estávamos pré-combinados e decididos sair no sábado pela manhã, às 8hs, do Posto Brasil Master de nossa cidade, Guarapuava/PR.
Após nossa confirmação por telefone, começamos a juntar as bagagens às 11hs da noite, fui abastecer minha moto e calibrar os pneus. Voltei para casa, preparei as bagagens na moto e deixei-a virada na garagem para não perder tempo manobrando-a na manhã de sábado. Eu e minha esposa preparamos nossas roupas, botas, luvas, capacetes, cds para ouvir nossas músicas preferidas na HD Electra. Dinheiro separado para pagar os pedágios, etc. Fomos dormir uma hora da manhã animados e ansiosos para levantar as sete.
Saímos de Guarapuava/PR exatamente no horário e local combinado. O roteiro estava certo e às 8hs pegaríamos a BR 277 sentido Curitiba, trecho de 250km. Depois desceríamos a BR 376/101 sentido Tubarão/SC, trecho de 424km, com destino programado para pernoitarmos numa agradável cidadezinha de cinco mil habitantes chamada Bom Jardim da Serra/SC, trecho de mais 89km, localizada no alto da Serra do Rio do Rastro.
Já havíamos reservado Hotel para dois casais que chegariam entre 17 e 19hs de sábado. Nosso planejado era o Gerson tocar na frente, fazermos duas paradas para esticarmos as pernas, fazer um lanche e completar nossos tanques. Uma em Palmeira/PR e outra em Joinvile/SC. Percorreríamos exatos 763km com certa tranqüilidade, na teoria. Quanto ao ritmo da tocada, ficamos de acordo que andaríamos na média de 120km/h, pois nossas motos são do mesmo modelo, marca e cilindrada, portanto, não precisaríamos nos preocupar com autonomia ou potência. Nessa altura da vida não precisamos mais andar com pressa, o importante é chegar no destino inteiro.
Ficar esperando alguém de um grupo que anda com a “roda presa” pode causar irritação, isso já aconteceu comigo em pequenos trajetos. É complicado ter que chamar atenção de um colega/amigo com esse “defeito”. Também já aconteceu o contrário, tem alguns que são “afoitos”, querem andar na frente de todos, imprimindo um ritmo cada vez mais acelerado, correm um risco desnecessário e pior, colocam os outros em risco.
Até Curitiba foi tudo perfeito, a estrada estava uma delícia. Quando finalizamos o contorno sul da capital, encontramos um afunilamento fenomenal de veículos na entrada da BR 376/101 sentido SC, coisa “normal” para uma feriado prolongado na capital paranaense, que emenda até dia oito de setembro. Para não sermos espremidos entre carros, caminhões e ônibus, ligamos o pisca alerta e fomos tocando em primeira marcha pelo acostamento, muito devagar e com atenção redobrada, pois aquela situação merecia muita cautela. O trânsito estava completamente travado. Algumas centenas de metros à frente, o trânsito começava a fluir vagarosamente, e de novo pegamos a pista. Assim foi até Garuva, divisa de estado PR/SC quando estávamos descendo na Serra, outro engarrafamento terrível, tudo parado, alguns veículos com motores desligados. Nunca tinha visto aquilo daquele jeito. Foi preciso, novamente pegar o acostamento em primeira marcha, pisca alerta ligado e tocar lentamente. Estávamos apreensivos e tensos. Atrás de nós, pelo retrovisor avistava-se uma longa fila de motociclistas aproveitando aquele mesmo caminho. No corredor em meio aos veículos parados, avistamos nossos amigos de nossa cidade, o Geraldo e o Zito, com suas V Strom e as esposas engarupadas com destino à praia de Camboriú/SC. Logo mais à frente, numa curva da serra, havia um veículo Gol estacionado no acostamento com uma garota passando mal sentada no banco de trás, com a cabeça para fora, vomitando violentamente.
Esse ritmo perdurou até o posto de pedágio. Dali para frente melhorou um pouquinho o trânsito, mas as duas pistas de rolagem estavam lotada, do lado direito veículos pesados, do lado esquerdo, veículos leves e motocicletas de todas as marcas, modelos e cilindradas. Alguns motociclistas de motos pequenas, como sempre, muito jovens e inexperientes, fazendo “costuras” e ultrapassagens perigosíssimas, com suas namoradas na garupa, alguns até sem equipamento.
Próximo a Joinville/SC, o trânsito fluía bem, andávamos a 110/120km/h constantes atrás dos outros veículos que estavam à nossa frente na pista da esquerda, ultrapassando os veículos pesados. De repente, um Ford Ká preto com um jovem casal quase me empurrou contra a mureta, fazendo conta de que ali não havia ninguém.
Passando por Florianópolis, quando a pista deixa de ser dupla e passa a ser simples, foi outro engarrafamento assustador. O trânsito estava caótico e parado. Vimos carros de todas as marcas, anos e modelos, caminhões, bi-trens, ônibus, vans, alguns além da família, traziam seus cães, outros com gatos. Quando estamos de moto, temos a vantagem de tocar lentamente no corredor que se forma entre as pistas, ou conforme a situação, tocar lentamente pelo acostamento com muita atenção. Logo à frente melhorou um pouquinho, o trânsito fluía entre 40 a 60km/h. Nessas situações percebemos a imprudência e a irresponsabilidade de alguns motoristas, querendo “tirar o atraso” podando de forma agressiva e perigosa em locais sem espaço. As motos pequenas então, é impressionante a capacidade desses “pilotos” cometerem atos de irresponsabilidade, principalmente com trânsito lento.
Alguns km à frente, começaram a surgir aqueles desvios da pista simples para pista dupla com trechos de mais ou menos uns 800 metros duplicado, nesses espaços que o trânsito começa a desafogar, onde os veículos leves ultrapassam os veículos pesados e lentos. No quarto ou quinto trecho duplicado, um velho caminhão Mercedes, no toco e vazio, ultrapassou uma carreta carregada sem dar sinal, simplesmente o motorista tirou bruscamente o caminhão para a esquerda, bem no instante que o Gerson já havia sinalizado e iniciado a aceleração para ultrapassá-lo. O caminhão ocupou a pista inteira da esquerda, fechando o Gerson, jogando-o para a esquerda e deixando-o sem espaço para rodar. Ele freou sua HD Electra violentamente (vi sair faísca do rodado traseiro da moto junto ao asfalto), ela balançava para esquerda e para a direita, ele literalmente dançava em minha linha de visão frontal, foi horrível assistir aquela cena, pensei que ele cairia com sua esposa. Ainda bem que conseguiu dominar a situação e voltar ao equilíbrio normal, pois para quem está vendo tudo acontecer, chega a ser angustiante. Sua esposa, Vera, ficou nitidamente assustada.
Após esse susto, continuamos com cuidados redobrados. Chegamos a Tubarão/SC, por volta das 19hs. Paramos em um posto de combustível para esticarmos as pernas. Decidimos nos instalar e pernoitar no Hotel San Silvestre.
Após um merecido banho, colocamos nossos jeans e fizemos uma refeição à base de frutos do mar no restaurante Dom Camilo. No domingo pela manhã, às 9hs partimos de Tubarão em direção a Orleans, passamos por Lauro Muller e iniciamos a subida da Serra do Rio do Rastro apreciando cada detalhe da beleza deslumbrante daquele lugar único. É difícil mensurar explicando em palavras a magnitude real da beleza que nossos olhos captam. Paramos em todos os mirantes para visualizar e fotografar os vários ângulos que cada altura da Serra proporciona. Rodando e olhando para baixo rente à mureta de proteção da direita, dá vertigem, pois é um penhasco gigantesco e assustador. Do lado esquerdo, é um paredão imenso esculpido na rocha bruta. Cada mirante possui uma placa indicativa de altitude, tipo de arenito estratificado e basalto que formaram aquele local.
Ao terminar de subir os 12 Km da Serra, há o último e maior mirante localizado numa chapada, com altitude de 1450 metros, cuja visão panorâmica total da Serra lá de cima é de tirar o fôlego. A visão da pequena estrada cinza asfaltada serpenteando e subindo os paredões de basalto misturado com o verde da vegetação é incrível, são pinceladas gravadas ao ar livre do Artista Divino numa belíssima tela natural gigante. Dizem que quando o dia está ensolarado e límpido, é possível visualizar o mar no infinito horizonte. Nessa chapada há uma boa estrutura, com lanchonetes, banheiros, casas de souvenirs e um amplo estacionamento que estava lotado de carros e motocicletas de vários lugares do Brasil.
Depois dessa admiração diurna, tocamos mais oito Km para a pequena e aconchegante Bom Jardim da Serra. Nos instalamos na Hospedagem Planalto. Mais ou menos às 17hs, pegamos nossas motos e retornamos à Serra para a visualização noturna. É a única Serra iluminada do Brasil, há um poste metálico com potentes lâmpadas a cada 50 metros. Descemos toda a Serra, aguardamos escurecer, as lâmpadas foram acendendo alternadamente, possuem células fotoelétricas e de acordo com o grau de luminosidade natural, à medida que escurecia, as lâmpadas acendiam. Quando a noite chegou e todas as lâmpadas estavam acesas, é outro espetáculo à parte. Subimos novamente a Serra lentamente, fotografamos vários ângulos e nesse cenário conseguimos visualizar a “serpente de luzes” que assinalam o zigue-zague da estrada no paredão da Serra vista de baixo para cima. Durante a subida de dia, não temos noção de onde fica o traçado da estrada. É simplesmente impressionante. Valeu todo nosso esforço e cansaço para vislumbrar essa experiência única.
Retornamos à Hospedagem, tomamos um ótimo banho quente e fomos tomar um saboroso capuccino com um misto quente colonial no Schoko Haus, local simples mas com um atendimento ótimo.
Na segunda-feira, dia sete, tomamos nosso café da manhã e por volta das 9hs iniciamos nossa jornada de volta. Passamos pelo Snow Valley, local que possui a maior tirolesa (500m) do sul do país, visitamos São Joaquim, cidade mais fria do Brasil. Passamos por Lages, Caçador, General Carneiro, Palmas, Mangueirinha, Candói e finalmente, às 18hs30 chegamos em nossa querida Guarapuava. Quando entrei em minha garagem, fotografei o hodômetro de minha HD com exatos 1.529,4 Km rodados nesses três dias. Estava cansado, mas com o espírito renovado. Quanto ao casal de amigos, foi a primeira vez que fiz uma viagem de três dias com eles. Nossos passeios de moto limitavam-se a “tiros curtos” nas tardes de sábado ou domingo, rodávamos entre 100 e 500km em um trajeto pré-definido de ida e volta para casa. Nosso “contrato” para essa viagem foi perfeito, nossas esposas se “afinaram” muito bem. Houve companheirismo e afinidade durante todo o percurso, sempre que alguém queria dar uma “paradinha” para fotografar alguma cena interessante, ou usar o banheiro, era só sinalizar, ambos parávamos, descíamos das motos e executávamos aquilo que desejávamos, sem nos preocupar com o tempo gasto, em outras palavras, sem stress. Com certeza haverá outras ocasiões que desfrutaremos juntos sobre duas rodas. Um abraço a todos e até a próxima.
O “motonauta” Antonio Carlos Ferreira participou do Moto Repórter, canal de jornalismo participativo do MOTO.com.br. Para mandar sua notícia, clique aqui.
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