Um presente do passado

Escuna Anabel, construída com a ajuda do motociclista estradeiro, encara teste definitivo.

Por Leandro Alvares

“Boa tarde, posso entrar a bordo?”, disse Mario Buckup, que acabara de chegar de São Paulo com a encomenda. As velas finalmente tinham chegado!

Eu em particular não via a hora de velejar com a escuna, mas ao que tudo indicava todos os envolvidos direta ou indiretamente tinham a mesma ansiedade.

Dias antes, tínhamos instalado os trilhos de alumínio nos dois mastros e feito toda a amarração das retrancas e caranguejeiras, bem como toda a parafernália dos controles que incluíam quatro catracas, vários mordedores, roldanas, adriças e escotas. Só faltavam as velas e elas estavam ali estendidas, em cima da cabine, prontas para serem erguidas.

O tempo passou muito rápido e depois de nove meses poderíamos saber se todo o trabalho iria dar resultado ou não, pois só velejando teríamos certeza se a Anabel I estava apta a navegar a Pano.

Nessa noite não dormi, pensando em cada detalhe de amarração, porcas, parafusos, pregos, abraçadeiras e estaiamentos. Se alguma coisa desse errado os mastros poderiam vir a baixo e isso seria para lá de arriscado.

Levantamos muito cedo. A Marina Aratu estava em silêncio. Há um mês e meio estávamos dormindo no barco. Mestre Zezinho prepara um café rápido, logo em seguida subo no mastro para checar os cabos de aço, lá em baixo dentro da casa de maquinas Zezinho verifica os níveis de óleo e diesel, abre os registros de entrada de água salgada do motor e confere os cabos de comando da caixa de leme.

Eu, a 16 metros de altura pendurado na cruzeta, estou brigando com uma cupilha que teima em não entortar, mas um alicate de bico resolve o problema. Tudo checado, desço lentamente vendo o pessoal que ira compor a tripulação chegar: Luis Antonio, um apaixonado por barcos, Julio Esteves, navegador peso pesado que cruzou em solitário o Atlântico da África para o Brasil em um catamarã de seis metros, e o não menos famoso Mario Buckup experiente e reconhecido velejador de grandes regatas.

A Escuna Anabel está pronta e parte para o seu definitivo e festivo teste. Velas ao vento, a moça navega serena. No GPS a marca de oito nós com vento fraco e mar liso pouco aderna e com as velas cheias lá vai ela singrando tranqüila as águas baianas, águas essas que já estavam saudosas de sentir um casco roliço e silencioso acariciando sua superfície, exatamente igual à de antigas navegações de remotos  tempos.

Um presente do passado para quem estava a bordo, para quem viu a Escuna passar e quem sabe até para a própria memória baiana.

Fonte:
Equipe MOTO.com.br

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