Meu pé de araçá
Uma história de infância surgida durante visita ao Salão da Motocicleta, em São Paulo.
Por Leandro Alvares
Por Leandro Alvares
Natal de 1958. No pé do pinheiro enfeitado tinha um pacote enorme com um laço vermelho, e eu estava curioso para saber o que era aquilo. Seria o tão sonhado presente que há tempos queria ganhar?
Fui ver minha mãe, que com minhas tias andava atarefada com os preparos de última hora para a já tradicional ceia da meia noite, para disparar uma pergunta: “Sabe o que é aquele pacotão na sala?”. “Sei e não é para você, xispa daqui”, respondeu.
Não satisfeito com a resposta fui procurar meu avô que estava conversando com meu pai sobre uma velha motocicleta que eles tinham visto rodando pelo bairro. Nova pergunta: “Para quem é aquele presente grande que está na arvore de Natal?”A resposta foi seca: “Não fazemos a menor idéia”.
Meia noite, já era hora de abrir os presentes. Fui o último e o pacotão era para mim, uma reluzente e marrom escura bicicleta da marca Gorik com freio traseiro no contra pedal. Eu naquela época já sabia pedalar, porém com as bicicletas dos outros, mas aquela belezura agora era minha e com ela passei a rodar por todo o bairro.
Que maravilha! Ir para a escola então era uma aventura, principalmente quando chovia e voltava sempre enlameado, para desespero de minha mãe. Lembro também que perto de casa tinha uma chácara bem próxima do rio Pinheiros (SP)e um pé de araçá enorme.
Dava um pulo por lá sempre que podia, subia na árvore para comer a tal frutinha e aproveitava para pescar lambari na lagoa. A “bici” era a fiel companheira de todas as horas e com ela eu me divertia muito.
Um belo dia estava pendurado na árvore e a minha bici estacionada na sombra da frondosa fruteira quando de dentro do Galpão da Chácara surgiu um som fortíssimo, na verdade parecia mais um urro de leão, uma barulheira medonha. Desci rapidamente, corri até a porta lateral e entrei.
O que vi foi uma bicicleta muito maior que a minha, dotada de pneus enormes, cheia de cromados, um selim que mais parecia um sofá. E como ela trepidava, fiquei paralisado vendo aquele monstro pronto a me abocanhar.
Ao lado da máquina um senhor com muita idade, de cabelos e barba brancos com e um sorriso espontâneo no rosto. Ele vestia calça e jaqueta de couro preta e um gorrinho de lona marrom. Em suas mãos um óculos de aviador. “Vou levar uma bronca”, pensei. Virei e antes que eu pudesse me ver livre de tudo aquilo escutei do velho senhor. “Vou viajar , cuide bem do meu pé de araçá”.
O tempo passou. Em 1966 rodei pela primeira vez de motocicleta. A chácara já não existe mais e o pé de araçá se foi, mas hoje eu sei que aquele velho senhor era um motociclista e a moto uma Indian.
Lembrei dessa historia quando entrei no estande da revista MOTO.com.br e vi uma delas tranqüilamente estacionada a me procurar.
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