Caminhos do café com a Harley-Davidson Ultra Limited
Modelo touring faz uma viagem até a cidade história de Bananal (SP), na divisa de São Paulo e Rio de Janeiro
Por Aladim Lopes Gonçalves
Por Aladim Lopes Gonçalves
“Ali tudo foi, nada é. Não se conjugam verbos no presente. Tudo é pretérito”. As palavras de Monteiro Lobato (1882-1948) escritas em 1906 no conto “Cidades Mortas” descrevem, de forma melancólica, os municípios do Vale Histórico, no extremo leste de São Paulo. A região, que já foi uma das maiores produtoras de café do Brasil em meados do século XIX, guarda hoje apenas as lembranças de uma riqueza que não volta mais. Só restaram ali os belos casarios apalaçados de dois e três andares; as opulentas Casas-Grandes em belas e históricas fazendas que hoje não têm sequer nem um pé do “Ouro Negro” que trouxe e levou embora o progresso da região.
A cidade que melhor simboliza a trajetória do Vale Histórico, tanto pela riqueza de suas construções ou pela história de suas fazendas, é Bananal, na divisa entre os Estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Tombada pelo patrimônio histórico, a cidade já foi uma das mais ricas da então província de São Paulo entre os anos de 1830 e 1880, auge da produção cafeeira na região, quando chegou até a cunhar sua própria moeda.
Além da arquitetura e de sua riqueza histórica, Bananal fica aos pés da Serra da Bocaina. Bom destino para um roteiro de mototurismo em um final de semana, a cidade oferece confortáveis hotéis fazendas com uma simples, mas saborosa culinária interiorana; muita história e diversas belezas naturais.
Distante 310 km da cidade de São Paulo e a 160 km do Rio de Janeiro, Bananal, ao contrário do que se possa imaginar, nada tem a ver com bananas. “Banani, na língua dos índios que aqui habitavam, denominava o ‘rio sinuoso’ que corta a cidade. Daí veio o nome”, conta João Antônio, bananalense de 47 anos, que vive da venda de suas obras em madeira talhada na Casa do Artesão, montada no Solar Aguiar Valim, uma das mais belas amostras arquitetônicas da cidade.
No caminho dos tropeiros
Embora o sistema de navegação na tela de 6,5 polegadas da luxuosa Harley-Davidson Ultra Limited indicasse outro caminho, optei pelo mais tradicional para se chegar a Bananal. Saímos de São Paulo pelas Rodovias Ayrton Senna e Carvalho Pinto, até Taubaté (SP), de onde seguimos pela Via Dutra até o km 36. Lá, uma enferrujada placa indica o início da SP-068, a Rodovia dos Tropeiros, caminho que se fazia a viagem entre São Paulo e Rio na época do Império.
O asfalto da rodovia até Areias, uma das primeiras cidades do Vale Histórico, é precário. Porém, a paisagem rural e as boas curvas compensam o sacrifício. Depois, a estrada melhora e o sistema de som da Ultra, que se conecta por meio de Bluetooth à MP3 players e celulares, embalou a prazerosa viagem de 316 km até Bananal – sendo 120 km na Rodovia dos Tropeiros.
Ao chegar à pacata cidade de 11 mil habitantes, o asfalto dá lugar a um calçamento tombado pelo patrimônio histórico. As primeiras placas indicam a Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte e a Estação Ferroviária, uma das atrações da cidade e que remete ao Ciclo do Café.
Importada da Bélgica toda desmontada e feita em ferro, a Estação Ferroviária é quase um símbolo da decadência da cidade. A estrada de ferro que ligava São Paulo e Rio, construída por iniciativas dos barões do Café, ficou pronta tarde demais – em 1888, quando as plantações dali não eram mais prósperas, – e teve pouca importância econômica. Restaram apenas sua estrutura e uma velha Maria-Fumaça que percorria o ramal bananalense até Barra Mansa, já em terras fluminenses. Desativada em 1964, a estação foi tombada pelo Patrimônio Histórico em 1969.
Casario colonial
Pequena, Bananal concentra em alguns quarteirões diversas construções históricas. O ideal é estacionar a moto e percorrer, a pé, as ruas e praças para apreciar as fachadas de prédios como o Solar Aguiar Valim, infelizmente fechado para visitação. A Igreja Matriz fica em frente à praça principal, onde há também um antigo chafariz de onde não há muito tempo o povo podia retirar a água encanada desde a época do Café.
Na rua principal, fica a histórica “Pharmácia Popular”, com a fachada e a grafia antiga preservadas. Uma das mais antigas em funcionamento, o interior foi modernizado depois que o antigo proprietário, “Seu Plínio”, faleceu há três anos. Restaram apenas alguns recipientes antigos e o chão decorado com ladrilhos hidráulicos. Aproveite a caminhada para observar outros sobrados e construções que foram restauradas pelos atuais proprietários.
Se a fome bater, fica ali no Largo da Matriz o restaurante “O Casarão”, que tem um buffet self-service de uma gostosa comida caseira. Outra opção é o “418”, ao lado do belo prédio do Fórum e do Solar Aguiar Valim. Nesta praça João Rubião Júnior, há ainda a Igreja do Rosário, a antiga capela dos escravos construída em meados do século XIX.
Fazendas
Mas é fora da cidade, na continuação da Rodovia dos Tropeiros, que ficam as maiores riquezas de Bananal: as antigas fazendas cafeeiras. Algumas transformadas em hotéis e outras restauradas e abertas à visitação.
Uma das mais famosas, por ter sido cenário de inúmeras novelas e minisséries de televisão, a Fazenda Boa Vista oferece mais de 30 quartos com pensão completa e algumas atrações para crianças. Os quartos na Casa-Grande são antigos e aconchegantes. O mais “luxuoso” já hospedou até mesmo o Duque de Caxias e hoje pode acolher até cinco pessoas. Com uma vista privilegiada, de suas grandes janelas avista-se a majestosa entrada da propriedade com palmeiras imperiais. Recentemente, o local foi palco para a refilmagem de Saramandaia (2013).
Devidamente hospedados e depois de diversas indicações dos locais e dos funcionários da Boa Vista, pegamos as motos para visitar a Fazenda Loanda – que fica na mesma estrada alguns quilômetros a frente. Para chegar lá é preciso pegar cerca de 600 metros de estrada de terra batida, fácil de percorrer e sem problemas até para as enormes Harley-Davidson que pilotávamos.
Construída em 1790 no estilo colonial mineiro, a Loanda foi reformada em 1840. “A moda na Europa era o estilo neo-clássico e o então proprietário, o Barão da Joatinga, fez questão de aplicá-lo a sua morada”, conta o atencioso Pedro Teixeira, atual proprietário e morador que recebe os visitantes para uma visita guiada ao custo simbólico de R$ 10,00.
A Fazenda Loanda passou por uma completa restauração que durou mais de 10 anos. “É caro restaurar e fui fazendo aos poucos”, explica Teixeira. Um trabalho digno de elogios e que manteve muito do mobiliário e a planta original. Os cômodos no andar superior – que incluem os quartos, a Sala de Sarau, banheiro e uma enorme cozinha - ocupam cerca de 750 m².
Em cada canto, em cada quarto há uma boa história contada por seu Pedro. O piano alemão dos anos de 1800 foi restaurado e funciona perfeitamente como nos tempos em que embalava os saraus. No salão, há ainda uma bela namoradeira, onde os noivos podiam sentar-se lado a lado, mas sempre sob o olhar atento de algum membro da família. “Como não havia luz elétrica, quando começava a escurecer o ‘vigia’ acendia uma vela para ficar de olho nos namorados. Daí veio a famosa expressão: segurar vela”, conta seu Pedro. Escondido em um dos cantos, há um quadro pintado por Anita Malfatti e adquirido pelo pai do proprietário na década de 1940.
No andar de baixo, o antigo porão, abrigava os escravos que trabalhavam na Casa-Grande e também serviçais como sapateiro, marceneiro, selador. O local também servia de pouso aos visitantes. “Antigamente, não se tinha costume de receber quem não fosse da família no andar superior. Tinham muito receio do contato de estranhos com as mulheres jovens e solteiras”, esclarece. A antiga capela também foi restaurada. Os afrescos e painéis não puderem ser recuperados e foram repintados. Já o altar é o mesmo trazido da Europa há muito tempo. Além da Fazenda Loanda, parada obrigatória de quem vai a Bananal, as Fazendas Coqueiro e Resgate também merecem ser visitadas.
Natureza
Depois da aula de história in loco, fomos conhecer o tal “Sertão de Bananal”. Mas não se deixe enganar pelo nome, pois o bairro fica incrustado na verdejante Serra da Bocaina. Para chegar até lá, pura diversão em duas rodas: são 26 km por uma estreita e sinuosa rodovia, que exige perícia e cuidado nas curvas, mas com asfalto recém-terminado e uma paisagem de tirar o fôlego. Bastava engatar terceira marcha e deixar que o excelente torque do motor V2 da Harley desse conta do recado.
Se você busca também o turismo de aventura, essa região da Serra da Bocaina tem opções de hospedagens e diversas caminhadas em trilhas até belas cachoeiras. Há ainda alguns mirantes para se apreciar as montanhas e os muitos pássaros da região.
Fomos até lá atrás da boa comida e da tranquilidade do restaurante “Chez Bruna”. Fechado durante a semana, o local serve boa comida mineira e trutas deliciosas aos sábados e domingos.
Guia de Bananal
Atrações no Centro Histórico
- Igreja Matriz do Senhor Bom Jesus do Livramento – Construída em 1811, em estilo colonial, possui no Santíssimo os Doze Apóstolo em madeira. De arquitetura simples com planta fechada, é motivo de orgulho dos bananalenses. Praça Monsenhor Cid França Santos.
- Igreja Nossa Senhora da Boa Morte - Existente desde o século passado, foi reformada várias vezes e até reconstruída. Rua Coronel João Ramos Nogueira Fragoso.
- Estação da Estrada de Ferro - Inaugurada em 1889, a estação de Bananal é um prédio de excepcional interesse como construção metálica, sendo o único no gênero na América Latina. Foi importada da Bélgica e é representativa da pré-fabricação em aço possibilitada com a Revolução industrial.
- Sobrado da Dona Laurinha - Construída em 1811 foi tombada pelo patrimônio e restaurada e internamente é também um pequeno museu. Móveis e louças antigas, objetos raros e quadros, mostram um significativo acervo da época, que completam a propriedade como um todo, digno de admiração. No local há venda de artesanato. Largo da Matriz - Praça Pedro Ramos
- Solar Aguiar Valim - Construído em meados do século XIX, este sobrado retrata bem a riqueza do Ciclo do Café. Construção de caráter monumental, tem características neo-clássicas, como as portas principais em arco pleno e a escada principal em lances simétricos. Apresenta pinturas murais de Villaronga. Funcionou no prédio o grupo escolar Coronel Nogueira Cobra e a Prefeitura Municipal de Bananal. Atualmente, está fechado à visitação. Fica na Praça João Rubião.
- Chafariz - Inaugurado em 1880, com alvoroço, marcou a conclusão dos encanamentos e o reservatório de água da cidade. Até poucos anos atrás, ainda jorrava água. Alguns historiadores afirmam que esta fonte veio importada da Europa. Localizado na Praça da Matriz.
Fazendas para visitar
- Fazenda Loanda – Restaurada pelo atual proprietário e morador, Pedro Teixeira, mantém um impressionante acervo de mobiliário antigo e a planta original. Oferece visitada guiada aos finais de semana por R$ 10,00. Durante a semana é preciso marcar com antecedência pelo site: www.fazendaloanda.com. Rodovia dos Tropeiros, km 328
- Fazenda Resgate – Tombada pelo patrimônio histórico, a fazenda mantém o imponente casarão, da época do Ciclo do Café, com seus cômodos, a senzala e uma capela. O acervo tem preciosidades como pinturas, móveis, santos de madeira e um cravo (instrumento musical de teclas) que pertenceu à Marquesa de Santos. Foi a principal fazendo do Comendador Aguiar Valim, que também construiu o solar na cidade. É preciso agendar a visita com antecedência pelo site: www.fazendaresgate.com.br. Rodovia dos Tropeiros, km 324.
- Fazenda dos Coqueiros – Construída em 1855, pelo Major Cândido Ribeiro Barbosa e sua esposa D. Joaquina Maria de Jesus, mantém intacta sua estrutura. Conta com um banheiro típico dos tempos coloniais. Também exige agendamento prévio. www.fazendadoscoqueiros.com.br. Rodovia dos Tropeiros, km 309
Onde se hospedar
- Fazenda Boa Vista – Originária do final do século XVIII, foi a maior produtora de café do município. Em 1842 hospedou o então Barão de Caxias e a caminho da Silveiras um dos focos da rebelião liberal. Hoje é o Hotel Fazenda Boa Vista guardando ainda alguns resquícios do passado. Foi palco de diversas minisséries e novelas. Oferece pensão completa. Site: www.hotelfazboavista.com.br - Rodovia dos Tropeiros, km 327.
- Fazenda Três Barras – Conta-se, que em 1822, hospedou o príncipe D. Pedro em suas viagens a São Paulo que culminou com o grito do Ipiranga. Hoje, sem o esplendor de outrora, mas ainda muito bonita, transformou-se em Hotel-Fazenda; Conserva ainda muito do seu passado, como por exemplo, o aposento duplo usado pelo Príncipe com os móveis da época. O restante da casa (parte interna) sofreu modificações. Site: www.hotelfazendatresbarras.com.br – Rodovia dos tropeiros, km 320
Onde comer
- Casarão – Oferece uma comida caseira saborosa em um buffet variado de self-service. – Praça Pedro Ramos, 113
- 418 – Também oferece comida por quilo. Fica na Rua Antonio Valipte, 186, ao lado do Fórum e do Solar Aguiar Valim.
- Habeas Copus – Essa cervejaria e restaurante é a única a oferecer comida à La Carte em Bananal. Funciona apenas à noite. Rua Dr. José Rangel de Almeida, 40
- Chez Bruna – Restaurante que serve boa comida mineira e trutas no alto da Serra da Bocaina. Também oferece camping. Fica na rodovia SP-247, km 28, no Sertão de Bananal.
Como chegar
- Rio de Janeiro – Fica a cerca de 160 km do Rio pela Via Dutra. Em Barra Mansa, pegue a saída 273 para Bananal.
- Belo Horizonte – Siga pela BR-040 até Juiz De Fora e depois pegue a BR-267 e a MG353/RJ-151 para Volta Redonda (RJ). Vá até Barra Mansa e pegue a saída 273 da Via Dutra. São 449 km.
- São Paulo – São 316 km de distância pelo Corredor Ayrton Senna-Carvalho Pinto e Via Dutra até a saída 36. Depois aprecie a bela paisagem e as curvas da Rodovia dos Tropeiros, que corta o Vale Histórico até Bananal.
Harley-Davidson Ultra Limited
A mais luxuosa e confortável Harley-Davidson é um convite para pegar a estrada. Dotada de duas malas laterais e um grande top-case acomoda bem a bagagem de um casal para um roteiro de final-de-semana como esse até Bananal – ao todo são 135 litros de capacidade. Oferece um completo equipamento de entretenimento com sistema de som, rádio citizen band e conexão Bluetooth ou por USB a MPS Players e celulares. Há ainda um útil sistema de navegação por GPS para você não se perder por aí.
Reformulada para 2014 por meio do Projeto Rushmore, o modelo touring ganhou motor V2 Twim Cam 103 – de 1690 cm³ - com sistema de refrigeração líquida no cabeçote, que esquenta menos e tem mais potência e torque. Oferece câmbio de seis marchas e piloto automático. A Ultra Limited também conta com sistema de freios Reflex com ABS conectado eletronicamente, que distribui a força de frenagem em ambas as rodas.
Com banco muito confortável e excelente proteção aerodinâmica, a Ultra Limited parece “navegar’ na estrada. Basta programar o piloto automático para a velocidade limite da rodovia e curtir o som e a paisagem, mas sem deixar de prestar atenção à estrada. Embora seja pesada, 414 kg em ordem de marcha, a Ultra Limited, a exemplo de outros modelos da linha touring, tem ciclística bastante equilibrada e mal se nota o excesso de peso em movimento. Nas curvas mais fechadas, as pedaleiras raspam no chão, mas essa enorme H-D mantém a trajetória. Sofreu um pouco nos primeiros quilômetros da Rodovia dos Tropeiros em função do asfalto ruim, mas se o piso for bom é um excelente companheira de viagem. Porém, exige atenção e cuidado na hora de estacionar e manobrar, em função de seu porte e peso.
Com tanque de 22,7 litros, a Ultra Limited teve consumo variando entre 14,6 km/l e 16,2 km/l. Com isso a autonomia superou facilmente os 300 km e cheguei até Bananal sem ter de parar para abastecer. A Ultra Limited tem preço sugerido a partir de R$ 86.200.
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