Rally dos Sertões: Comentários e dicas de um piloto
Aleksey Stivanin fala dos desafios e dificuldades do rali e a preparação necessária para encarar os Sertões
Por Paulo Souza
Por Paulo Souza
Aleksey Stivanin
A prova
São 10 dias e cerca de 6 a 7 horas por dia em cima da moto. As distâncias são grandes e o cansaço acumulado é o grande inimigo, pois é o que faz a concentração e o reflexo diminuírem fazendo com que um pequeno vacilo cause um grande problema. A navegação é fundamental: interpretar bem a planilha faz com que se ganhe tempo correndo menos riscos. Na planilha estão marcados não apenas o caminho, mas também os perigos do trajeto e traz muita tranquilidade para o piloto saber que não está perdido e avaliando corretamente o nível de perigo dos obstáculos.
Quanto ao terreno, em especial este ano os Sertões foi marcado por longos trechos de areia, às vezes mais leve outras bem pesada. Locais como o deserto do Jalapão, Maranhão ou noroeste da Bahia são famosos pela dificuldade a exigirem o extremo de motos e pilotos. As longas distâncias de deslocamento (parte não cronometrada da prova) somam ao cansaço e desgaste.
Atenção às etapas maratona: são aquelas em que não há apoio mecânico, ou seja, os competidores rodam dois dias sem fazer manutenção nas motos. Exigem um check list cuidadoso antes de ser iniciadas: pneus, filtros de ar, kit de ferramentas, tudo tem que ser verificado antes de começar.
A preparação
Moto, físico, pilotagem, psicológico e equipe de apoio. A somatória dessas coisas é a receita para um Sertões bem feito.
Moto
Faça uma preparação cuidadosa da moto, independente do modelo, atentando para detalhes como preparação de suspensão (faz toda diferença), tanques extras de plástico muito resistente, torre de navegação bem fixada e de material resistente a impactos e torções mesmo que seja mais pesada. Pouco antes de ir, troque itens como: pistão e anéis, biela, válvulas e retentores, rolamentos de virabrequim, corrente de comando, comando de válvulas e tensor, kit de embreagem, rolamentos de rodas e suspensão e verifique as engrenagens do cambio. Leve as peças atuais da moto para reposição. Itens como pastilhas de freio, relação e especialmente pneus e mousses serão trocados com frequência durante o rally. Atente para os pneus usados na etapa maratona que são mais resistentes que os habituais e requerem um mousse com medida específica.
Para quem não conhece: mousses são estruturas "maciças" de borracha que substituem as camaras de ar nos pneus. A vantagem clara é que não furam ou murcham, a não ser que sofram superaquecimento e percam sua consistência, o que acontece se rodarem muito rápido (acima de 100 KM/h) em asfalto muito quente.
Todos os modelos de moto na faixa das 450 cc estão aptas a fazer o Sertões. Difícil dizer qual a melhor ou mais recomendada, pois isso vai da preferência, costume e tocada de cada piloto. As japonesas são conhecidas pela durabilidade enquanto as europeias exigem menos investimento em acessórios, por já virem com uma configuração bem completa de itens de série (freios, suspensão, etc...). Mas tudo isso é muito particular. Encontre uma moto que você se sente bem pilotando e evite trocar de modelo às vésperas do rally. Dominar totalmente as reações da moto é item de segurança e conforto!
Físico
Não é necessário ser um atleta de ponta para fazer o rally, mas também não é "brincadeira" para alguém totalmente sedentário. A prova exige muito do corpo do ponto de vista muscular, tendões, joelhos, coluna e sistema cardiorrespiratório. O calor somado aos impactos, peso do equipamento e esforço para controlar a moto, especialmente em trechos de areia pesada, expõe a muitos riscos aquele que não tem um bom preparo. Desde uma queda por fadiga até desfalecimento por desidratação.
Hidratação é item essencial. Mesmo sem sede o piloto deve sempre beber água e manter a urina clara, sinal que o organismo tem sobra de líquido. Durante a prova coma bastante carboidratos e leve em sua mochila de hidratação não apenas água, mas isotônicos e/ou suplementos alimentares recomendados por médicos/preparadores. Apenas água não repõe toda a perda que o corpo tem ali.
Programe-se pelo menos um ano antes para fazer uma preparação aeróbica e grupos musculares específicos, notadamente: braços, costas, ombros e pernas. Perceba-se, ao longo deste período, após seus treinos com a moto você sai mais descansado e não sente dores musculares nos dias seguintes.
Treinos, pilotagem e preparo psicológico
O rally é antes de tudo um teste de resistência e concentração. Muitas vezes a tentação de "encher a mão" é grande, mas isso tem a contrapartida de aumento de risco e desgaste. Aos amadores ou pilotos inexperientes nesta prova, não recomendo uma pilotagem muito agressiva. É o velho lema do: “o negócio é chegar”! Se você chegar bem, sem quedas, erros ou quebras, fatalmente sua posição será boa e seu rally mais tranquilo.
Para obter este resultado é necessário conter a ansiedade. Informe-se ao máximo sobre a prova, conheça o regulamento, procure fazer outras provas de rally/baja para pegar ritmo de competição e principalmente: se familiarizar com as pessoas do meio, outros competidores, organização, mecânicos, etc... Isso vai fazer muita diferença nos dias do Rally.
Quanto ao tipo de treino com moto: acostume-se às longas distâncias ou longos períodos seguidos em cima da moto, mesmo em uma pista curta/pequena. Faça baterias de no mínimo 1:30h e não se preocupe tanto com tempo mas sim em estar totalmente adaptado e "encaixado" na moto. Procure variar terrenos e se possível viaje para andar em locais diferentes ao que você está acostumado, especialmente se sua região não tem areia.
Conhecer seus limites e respeitá-los é o primeiro passo para ter um rally seguro. Ao longo da prova ocorrem situações de extrema preocupação (etapa muito dura, problemas mecânicos, etc...) e também de extrema euforia, como completar uma especial ou trecho muito desafiador. Não se deixar tomar nem por um sentimento nem por outro e percorra um quilômetro de cada vez até o final. O quilômetro mais importante da prova é sempre "o próximo", pois qualquer relax antecipado pode fazer com que você não preste atenção a algo banal (pedra, lomba, depressão na pista) e um tombo "bobo" pode tirá-lo da prova.
Equipe de apoio: item fundamental para um bom rally ! Procure ir para a prova com pessoas conhecidas, que você se sente bem. Isso irá tranquilizá-lo além de fazer da prova uma grande diversão. A estrutura necessária é relativa, vai da vontade e "bolso" de cada piloto, mas recomenda-se ao menos uma pick-up rápida para descolamento e socorro mecânico e um caminhão com peças de reposição e equipe mecânica. De acordo com o número de competidores esta estrutura se redimensiona e pode ser dividida (o que é recomendável). Procure conhecer estes bastidores do rally e eventualmente acompanhe um ano apenas no apoio para entender a importância/logística desta função.
Meu recado
Esta foi minha terceira participação nos Sertões e tive a felicidade de mais uma vez completar a prova e obtive meu melhor resultado: 5º colocado na Super Production e 29º na geral. Participei com a estrutura super completa da Mobil RNN Sports a quem deixo meu imenso agradecimento.
Antes de tudo sou um apaixonado pelos Sertões e meu sonho é colaborar com outras pessoas que compartilham essa paixão para que também experimentem o que é fazer esta prova. Gostaria de ver um evento cada vez maior, com mais participantes e cobertura da mídia. Fica meu email para aqueles que quiserem entrar em contato e meu muito obrigado à equipe do moto.com.br pela oportunidade."
email: [email protected]
Assista ao vídeo de divulgação da equipe RNN Sports
O “motonauta” Aleksey Stivanin participou do Moto Repórter, canal de jornalismo participativo do MOTO.com.br. Envie sua notícia!
Fotos: Gustavo Epifanio, Marcelo Maragni, Theo Ribeiro, Vinícius Branca, André Chaco, Webventure/Divulgação
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