A 4,5 mil metros de altitude; o céu não é o limite para Paschoalin
Campeão Pikes Peak 2019, o brasileiro Rafael Paschoalin literalmente subiu aos céus numa Yamaha MT-07. Conferimos o que alterou em sua moto para fazer história
Por Gian Calabrese
Por Gian Calabrese
Já foram três temporadas pelas ruas e estradas do famoso TT - Isle of Man (Ilha de Man); a conquista de um título em duas participações na subida internacional de Pikes Peak (EUA); provas em North West 200 (Irlanda) e Macau (China); contudo, Rafael Paschoalin já tem em sua bagagem realizações jamais imaginadas tampouco conquistadas por um brasileiro e, por muito poucos pilotos dispostos a encarar as temidas corridas de estrada pelo mundo afora.
Já considerado um especialista na área, foi em Pikes Peak Hill Climb 2019, que finalmente o brasileiro 'sentou-se ao lado dos deuses da velocidade’.
Isso porque, nas corridas de estrada disputadas há mais de um século de uma forma ou de outra o perigo está lá. Mas a magia de fazer como nossos antepassados faziam desde os primórdios das corridas de motocicletas pelas vias públicas, também está lá. Essa é a essência, a energia do mais simples sentimento que impulsiona pilotos de todo o mundo a realizarem seus mais loucos sonhos, e que só compreendi após duas temporadas no TT.
Rumo ao topo!
No início de julho acompanhamos e também reportamos por aqui a espetacular façanha do ‘Rafa’ na conquista de Pikes Peak, na categoria Middle-wheight (peso-médio), na famosa subida da montanha no estado do Colorado, nos EUA. Agora que a motocicleta voltou ao Brasil, pudemos conhecer de perto a Yamaha MT-07 preparada por ele e sua equipe.
Fabricada no Brasil, e preparada por brasileiros!
Um dos pontos de partida e marcante no início do encontro foi a alegria em poder dizer que se tratava de um projeto em conjunto com parceiros nacionais, o fato da motocicleta ser fabricada em Manaus, e a utilização de produtos e serviços realizados por profissionais brasileiros, que deram o upgrade necessário que o piloto precisava para ganhar a montanha.
“Nesse ano graças a Yamaha do Brasil e nossos parceiros conseguimos levar a motocicleta preparada daqui. Desde o desenvolvimento do motor realizado passo a passo com colaboradores no Brasil, às mais de 400 passagens e horas no dinamômetro da fábrica Jeskap Escapamentos a fim de melhorar o desempenho da motocicleta, tudo isso e muito mais foram decisivos para conquistarmos o título”.
Na sequência, o piloto se referiu a escolha da motocicleta para 2019, fato que surpreendeu muita gente por ter optado pela MT-07 e não a ‘09’.
“Depois de fazer um trabalho detalhado na pista, analisando trecho a trecho com apoio da telemetria entre as 156 curvas em 20 km da subida, percebemos que a MT-07 poderia ser tão competente quanto a MT-09 utilizada ano passado na categoria Middlewheight, diante as características da pista, trechos curtos, com asfalto sujo, faixas na pista e imperfeições, comparamos os dados e vimos que a ‘07’ seria a moto perfeita para disputar esta categoria”, enfatiza. “A prova em Pikes Peak não é mais perigosa que a do TT, no entanto, ser rápido certamente é tão difícil quanto”, completou.
Cheia de detalhes, a moto recebeu um upgrade também nos demais componentes. Os freios, por exemplo, ganharam pinças Brembo, linhas Hel e pastilhas de carbono da AP Racing.
As suspensões também foram trabalhadas e alteradas por um dos melhores profissionais da área no Brasil, o José Carlos “Pitico”. Na traseira o amortecedor foi trocado por um da marca italiana Mupo totalmente regulável, e na dianteira, haviam duas opções: cartuchos Mupo, ou emuladores nacionais que segundo o piloto funcionaram muito bem.
“Hoje em dia, não se mexe muito em ‘cliques’ de suspensão, é uma tendência mundial, se faz poucas alterações, no entanto, há um trabalho principal que fazemos na geometria da moto, alterando a altura das suspensões, seja para o piso seco ou molhado. Repare que a frente é mais baixa que o normal e a traseira mais alta, com isso, ela aponta muito para a curva”.
Outro detalhe que chamou a atenção de todos foi o guidão.
“Essa é uma das maiores curiosidades que recebo em perguntas pelas redes sociais, como pode usar um guidão posicionado de cabeça para baixo? Usamos um guidão original de MT-03, e para usar nesta postura tive que rebaixar a altura do tanque de combustível, para conseguir o posicionamento ideal, além de novas pedaleiras da marca nacional ‘Bullet’. A ideia principal foi conseguir o mais próximo possível da postura perfeita da Supersport R6, alinhei as fotos pelo eixo do virabrequim e trabalhei em cima para isso, um trabalho bem minucioso, de formiguinha...”.
Ponto importante trabalhado pelo piloto e sua equipe foi o peso total da moto, cerca de 25 quilos a menos para a original.
“Para reduzir o peso total deixamos a moto bem minimalista. Colocamos uma bateria de lítio de 14 amperes, bem leve e que faz muita diferença. Um jogo de roda forjada de magnésio de R1, e só para explicar algo que consideramos importante é minimizar a perda da potência na roda, através de uma corrente mais fina, uma coroa de alumínio e principalmente um trabalho refinado nos rolamentos, o que deixa a roda traseira bem livre, perdendo menos potência do motor para roda traseira.”
Com grande variação de clima e pressão atmosférica, ele realizou um importante trabalho junto a Pirelli Moto ao longo do ano, já que Pikes Pike tem também grande variação no ‘grip’ e mudanças na superfície do asfalto, entre a base na largada a 2.300 metros de altitude para o topo a 4.500. Luiz Felipe Pestana, MKT Competições Pirelli Moto, comentou sobre alguns detalhes na escolha dos pneus.
“Um fator muito importante foi entendermos sobre as variações em Pikes Pike. É fundamental que tudo esteja bem detalhado, afinal a situação nesta competição é bem atípica já que as variações de temperatura e pressão atmosférica são muito grandes. A variação em temperatura chega a cerca de 15°C de ‘gap’, entre a base até o topo da montanha. Para isso, treinamos com diferentes temperaturas e pressões atmosféricas em vários testes no primeiro semestre, testamos algumas especificações de compostos do Pirelli Diablo Supercorsa em diversas simulações e temperaturas de asfalto ao longo do ano, o SC0, SC1, uma variação do SC1 protótipo, para encontrar a melhor solução para o comportamento desta moto. Ao final, optamos pelo SC1 ‘slick’ que trabalha melhor numa variação maior de temperatura, já que o SC0 geralmente ofereça mais ‘grip’ somente se a temperatura do asfalto está bem alta, então poderia perder rendimento ao longo da subida.”
Motor
A potência máxima desta MT saltou de 74,8 cv para mais de 100 cv, disse o piloto.
“No motor optamos por manter a cilindrada original (689 cm3), porquê além do cilindro fazer parte do bloco as camisas são muito próximas. O mestre Roberto ‘Cascão’ me ajudou a fazer um trabalho extenso de banco de fluxo para duto de cabeçote, uma taxa de compressão absurda, comando de válvulas especial, uso do combustível Metanol, TDI maior e nada de filtro de ar. A parte de baixo do motor é original, a embreagem é deslizante e sacamos o estator que não faz mais parte e não gera energia, então trabalhamos com cerca de três baterias. Junto ao Mário da Jescap desenvolvemos o escape perfeito para maior performance deste motor.”
A bordo da campeã!
A ideia foi conhecer os detalhes da motocicleta que venceu a subida da montanha e passar a vocês a experiência de pilotar o bólido, então, depois do bate-papo detalhado sobre a MT, foi hora de acelerarmos mesmo que por uma volta apenas, afinal haviam muitos jornalistas prontos para 'um dia de Rafael Paschoalin".
Logo de cara a posição de pilotagem chama a atenção como extremamente agressiva e pronta para a pista, muito diferente à versão original. Pedaleiras bem recuadas e corpo lançado a frente, ficou radicalmente fácil enfrentar o vento nas retas por conta do novo guidão e principalmente se pendurar nas curvas, como é possível ver nas fotos.
Os freios estão bem mais acertados para a situação, oferecem mais precisão e potência. Cravada no asfalto, essa foi a sensação que as suspensões trabalhadas passa ao piloto, a moto ficou arisca e precisa te convidando a ir mais rápido a cada curva.
Já os fatores que mais chamaram atenção foram: a capacidade de ataque às curvas, a velocidade de contorno e, principalmente a agilidade devido ao menor peso! Bem mais potente e agressiva, outra característica interessante foi perceber como o torque e a potência mesmo com tantas modificações ainda estão previsíveis, o que naturalmente é uma característica deste motor original, apesar de ter medidas de um motor superquadrado (80mmx68,6mm), a diferença entre o diâmetro e curso do pistão não é muito grande, o que facilita ainda mais a pilotagem, e impressionaram diante das modificações.
Contudo, fomos bem mais rápidos que imaginávamos numa pista tão sinuosa como na Capuava. Então, depois de apenas duas passagens na reta foi melhor voltar para os boxes com o sorriso no rosto, onde o Rafa Paschoalin já me aguardava ansiosamente!
Nossos agradecimentos especiais ao piloto Rafael Paschoalin, a Yamaha do Brasil, a Pirelli, Fazenda Capuava e a todos envolvidos nesta sensacional experiência!
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